segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Recursos juridicionais: breve introdução ao tema e algumas questões práticas



Recursos juridicionais: breve introdução ao tema e algumas questões práticas



Introdução:

1.       Recursos jurisdicionais



A base legal dos nossos recursos jaz no regime do CPC e nos art. 140ºss do CPTA. As decisões que admitem recurso são aquelas que hajam conhecido do mérito da causa, incluindo as que julguem excepções peremptórias (art. 142º/1 CPTA) e, além dos casos previstos na lei processual civil, cabe sempre recurso das decisões elencadas no nº3 do art. 142º CPTA e decisões que ponham termo ao processo por razões formais; as insusceptíveis de recurso, são as decisões de mero expediente ou proferidas ao abrigo de poderes discricionários (art. 679º CPC).



2.       Tipos


A divisão doutrinária faz-se entre recursos substitutivos ou cassatórios (conforme substituam a decisão ou verifiquem apenas da sua legalidade) e recursos de reexame ou de reponderação (conforme julgue de novo o mérito da causa ou apenas reveja a decisão tomada).
Quanto a divisão operada pela lei do processo administrativo, temos recursos ordinários (apelação, recurso de revista e recurso para uniformização de jurisprudência) e o recurso de revisão. No entanto, o art. 140º do CPTA remete para o regime da lei processual civil, que distingue entre recursos ordinários (apelação e revista) e extraordinários (recurso para uniformização de jurisprudência e recurso de revisão). Assim, analisemos:



a)      Recursos ordinários comuns – recurso das decisões dos TACs para os TCAs

b)      Recurso de revista per saltum para o STA – apreciação em segundo grau de jurisdição de uma sentença que ainda não transitou em julgado, art. 151º CPTA

c)       Recurso de revista para o STA – apreciação em terceiro grau de jurisdição, fundada em violação de lei substantiva ou processual, art. 150º/2 CPTA

d)      Recurso para uniformização de jurisprudência – visa impedir o tratamento desigual de casos substancialmente iguais, art. 152º CPTA

e)      Recurso de revisão – recurso de revisão de sentenças transitadas em julgado

Em resumo, temos então: o recurso ordinário comum (recurso de apelação), o recurso ordinário especial (recurso de revista per saltum dos TACs para o STA), dois recursos ordinários excepcionais (recurso de revista dos TCAs para o STA e recurso para uniformização de jusrisprudência para o STA) e um recurso extraordinário (o recurso de revisão).








3.       Particularidades



- quanto à legitimidade, tem-na a parte vencida, incluindo contra-interessados e qualquer outra pessoa directamente prejudicada, assim como o Ministério Público, legítimo quando a decisão tiver sido proferida com violação de disposições ou princípios constitucionais ou legais, art. 141º CPTA

- quanto aos efeitos do recurso, a regra residual é que têm efeito suspensivo salvo disposição especial (art. 143º/1), sendo que os recursos de intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias e relativos a providências cautelares têm efeito meramente devolutivo (art. 143º/2). A maior particularidade concernente aos efeitos do recurso pode ser encontrada no nº3 do art. 143º, ao permitir que o tribunal possa atribuir efeito meramente devolutivo ao recurso quando a suspensão dos efeitos possa causar uma situação de difícil reparação para a parte vencedora e para os interesses que prossegue

- quanto ao prazo, 30 dias contados a partir da notificação da decisão (art. 144º/1)



Após esta breve introdução à figura do recurso em sede de contencioso administrativo, abordaremos algumas questões derivadas da sua aplicação prática:

A)     Qual o valor dos processos de intimação para a passagem de certidão?

Imaginemos que António, requerente, atribuiu um valor inferior à alçada do tribunal do qual se recorre (art. 142º/1 CPTA), e nem o juiz nem Bento, o requerido, se pronunciaram sobre esta questão. Deve ou não ser admitido recurso?
Dispõe o art. 31º/1 do CPTA que a toda a causa deve ser atribuído um valor, e que é ao valor da causa que se atende para se determinar se cabe recurso e de que tipo (alínea c) do nº2); neste caso, o objecto do processo não é enquadrável nem no art. 32º nem no 33º do CPTA, pelo que há que recorrer ao art. 34º que estabelece o critério supletivo, uma vez que o que se pretende com uma acção deste tipo traduz-se numa prestação de valor indeterminável, não se conseguindo fazer uma correspondência económica. O nº2 do art. 34º dispõe que quando o valor da causa seja indeterminável, considera-se superior ao da alçada no TCA, podendo haver assim então lugar a recurso nos termos do nº3. Neste tipo de casos, será sempre admissível recurso de apelação independentemente do valor indicado pelas partes ou aceite por acordo, se o juiz não tiver fixado expressamente outro valor, dando-se prevalência ao critério do 34º/2 quanto à fixação do valor para termos de recurso.



B)      Deve o tribunal de recurso conhecer de questões colocadas pelo requerido vencedor nas suas contra-alegações mesmo que este não tenha requerido a ampliação do âmbito do recurso (art. 684º-A/1 CPC)?

Esta questão surge na maioria dos casos quando são inicialmente decididas questões independentes entre si e apenas uma é posta em causa pelo recurso. Esta problemática tem por base uma interpretação demasiado ampla do art. 149º do CPTA, que retira deste que tudo é permitido ao tribunal de recurso independentemente da vontade das partes e do pedido formulado, e que este afastaria a aplicação dos art. 684º e 684º-A do CPC. Mas o art. 149º do CPTA não afasta a aplicação destes dois artigos; todas as questões de que o tribunal conheceu e que não são abarcadas pelo âmbito do recurso mantêm-se inalteradas se o conhecimento do objecto do recurso não implicar o seu conhecimento, sob pena do tribunal conhecer de novo todas as questões já decididas, mesmo estas que não houvessem sido impugnadas – art. 684º/2/4 CPC. Conclusão – se o recorrente delimitar o âmbito do seu recurso, as questões não abarcadas não serão apreciadas nem consequentemente alteradas por este.



C)      Como compatibilizar os art. 144º/3 do CPTA e 688º do CPC (relativos à reclamação contra o indeferimento do recurso)?

O regime do CPTA remete para o CPC, mas há uma contradição entre estes dois regimes, uma vez que segundo o art. 144º/3 a reclamação faz-se para o presidente do tribunal que seria competente, enquanto que pelo art. 688º CPC a competência para decidir da reclamação é dada ao desembargador a quem foi distribuído o despacho que não admitiu o recurso. Temos aqui uma lei especial (CPTA) face a uma lei geral (CPC); no entanto, quis o legislador expressamente que o regime da reclamação fosse regulado segundo o disposto na lei processual civil, tal como o supra mencionado artigo do CPTA assim refere, pelo que é de entender que o art. 688º do CPC revoga regime do CPTA. 




Bibliografia:
1. ANDRADE, José Carlos Vieira de, Justiça Administrativa, Almedina, 2011.
2. RAPOSO, João, Cadernos de Justiça Administrativa, 2009. 



Mariana Lacueva Barradas, nº 18284.








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