segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Conceito e Impugnação de Acto Administrativo







Conceito de Acto Administrativo


Parte da doutrina tem reconduzido a nova noção de acto administrativo introduzido pelo Art. 120º do CPA ao conceito amplo de Acto Administrativo, do Prof. Marcelo Caetano. O conceito amplo de Acto administrativo, abrange não só os actos de conteúdo decisório, mas também os actos que exprimem apenas declarações de ciência, meros juízos de valor ou opiniões.

O professor Aroso de Almeida entende, no entanto, que o conceito plasmado no Art. 120º possui uma extensão intermédia (que não corresponde ao conceito amplo de Marcelo Caetano nem ao conceito restrito germânico, que nasceu de uma indefinição dogmática fruto das actuações jurídicas da administração que se foi construindo, principalmente por referencia a sindicabilidade ou, o mesmo será dizer, baseando-se na fiscalização de legalidade dos Actos de Administração pelas acções contenciosas), fazendo para tal, ainda uma referência À tipologia de Actos administrativos, desenvolvida pelo Prof. Freitas do Amaral que, doravante incluir os meros actos administrativos, nos seus exemplos desenvolvidos, referia-se tão somente a actos com conteúdo decisório.

Conclui o Professor Aroso de Almeida, que os actos administrativos a que o artigo supra citado remete, se circunscrevem apenas aos actos com conteúdo decisório (não se incluindo todas as manifestações jurídicas que, são meros juízos de valor ou opiniões que não exprimam resoluções que determinem o rumo dos acontecimentos a adoptar.) Logo, a maioria dos actos preparatórios dos procedimentos administrativos – pareceres não vinculativos, informações e propostas – não são impugnáveis porque não se reconduzem a decisões – não corporizam uma decisão de vontade.




Acto Administrativo Impugnável

 
O conceito de Acto definitivo e executório, que Marcelo Caetano definia como uma “conduta voluntária de um órgão de Administração no exercício de um poder público que para prossecução do interesse a seu cargo, dando termo a um processo gracioso ou dando resolução final a uma petição, define situações jurídicas num caso concreto coincide com o conceito, agora vigente, de “acto impugnável” do Art. 51º do CPTA? Ou seja, o novo conceito, já serve por si só, para delimitar o universo nas manifestações jurídicas concretas da Administração que podem ser objecto de impugnação contenciosa ou necessitamos de identificar, dentro dos actos administrativos, um círculo daqueles que, serão susceptíveis de impugnação?

O Art. 51º/1 do CPTA veio consagrar que, embora inseridos num procedimento administrativo, são impugnáveis os actos administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos . Assim, definiu o legislador, como princípio geral, o que se considera um acto contenciosamente impugnável, sublinhando o preceito “eficácia externa”. Na definição dada pelo artigo supra referido, parece mostrar-se pressuposto um conceito material de acto administrativo que se mostra enunciado no art. 120.º do CPA, no entanto, tal não parece ser a posição adoptada por Vieira de Andrade, “… o conceito processual de acto administrativo impugnável não coincide com o conceito de acto administrativo, sendo, por um lado, mais vasto e, por outro, mais restrito. É mais vasto apenas na dimensão orgânica, na medida em que não depende da tradicional qualidade administrativa do seu Autor (…) É mais restrito, na medida em que só abrange expressamente as decisões administrativas com eficácia externa, ainda que inseridas num procedimento administrativo, em especial os actos cujo conteúdo seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos” - artigo 51.º, números 1 e 2.

Consideram-se actos com eficácia externa, os actos destacáveis do procedimento, isto é, aqueles que, produzam efeitos jurídicos externos autonomamente, sem ser através do acto principal do procedimento. Pretendem-se assim excluir, os actos internos, ou seja, os que visem apenas a produção de efeitos nas relações intra-pessoais, atingindo apenas aspectos orgânicos das relações especiais de poder ou as relações entre órgãos administrativos, o que se coaduna com o 268º nº4 da CRP., que estabelece um direito fundamental de impugnação dos actos administrativos lesivos dos particulares.
O professor Vasco Pereira da Silva sustenta que o critério da impugnabilidade depende da função e da natureza da acção de impugnação:
Caso se trate de uma acção para a tutela de um direito do particular face a Administração – estamos perante uma função subjectiva, uma vez que a tutela principal que se pretende assegurar é a do particular e só depois a da legalidade e interesse público; Se, por outro lado, se tratar de uma acção para defesa da legalidade e do interesse público, considera-se que a função é predominantemente objectiva e, neste caso a recorribilidade dependerá da eficácia externa do acto administrativo.
O referido professor, critica ainda a redacção do artigo, sustentando que o mesmo nos leva a crer que o critério mais amplo é o da eficácia externa, enquanto o critério da susceptibilidade de lesão de direito, seria uma especificação do primeiro, quando na verdade, estes são dois critérios autónomos. Esta subalternização é, alias contrariada, pelo regime do CPTA, que prevê no seu Art. 54º, a impugnação de actos desprovidos de eficácia externa desde que, lesivos. 

Quanto À oportunidade para impugnar o acto, não importa, no entender do mesmo autor, se o acto foi praticado no inicio, no meio ou no fim do procedimento, tendo-se colocado um fim à definitividade horizontal (característica do acto administrativo que constitui a resolução final do procedimento administrativo, que põe termo ao procedimento).
O Professor Mário Aroso de Almeida defende, com base no previsto nos artigos 51º numero 1 e 3 do CPTA que “não são apenas impugnáveis os actos finais, que põem termo a procedimentos administrativos, mas também podem ser impugnados actos que não sejam o acto final do procedimento.” Afirmando que para tal baste “que se trate de actos administrativos, isto é, que tenham, em si mesmos, um conteúdo decisório.”

Relativamente à definitividade vertical, depreende-se da ausência de determinação legal expressa, que os actos administrativos com eficácia externa são imediatamente impugnáveis perante os tribunais administrativos, não sendo requerida a prévia utilização de qualquer via de impugnação administrativa. Como ainda parece decorrer dos arts 51º e dos números 3 e 4 do art. 59º do CPTA. Conclui-se portanto que, para se verificar o requisito do interesse processual não é necessário que o autor demonstre, perante os tribunais administrativos que havia tentado “infrutiferamente obter a remoção do acto que considere ilegal por via extrajudicial(…)A menos que esteja expressamente previsto na lei Mário Aroso de Almeida. Relativamente a esta alteração, Vasco Pereira da Silva diz saudar a orientação do legislador no sentido de se ter “afastado expressamente toda e qualquer exigência de recurso hierárquico necessário” (Art. 51º/1 do CPTA) que entendia ser inconstitucional à luz do Art. 268º/4 da CRP.




Actos de Conteúdo Negativo


Apenas os actos de conteúdo positivo podem ser objecto de um processo de impugnação , conteúdo esse que, nas palavras de Mario Aroso de Almeida “não se esgote na mera recusa de introduzir modificações jurídicas requeridas” (dirigidas À respectiva anulação/declaração de nulidade).

Quanto aos actos de conteúdo negativo, a reacção contenciosa passa pela dedução do pedido de condenação à prática de um acto que satisfaça a pretensão do autor ou que dê uma nova definição ao caso, sem que se reincida nas ilegalidades em que anteriormente, o acto negativo tenha incorrido (arts. 51º e 66º CPTA).

Contudo, Mario Aroso de Almeida, defende que os actos administrativos de conteúdo negativo não deixam de ser considerados actos administrativos, apelas pelo facto de terem deixado de poderem ser objecto de processo de impugnação, colocando como exemplo um acto que atribua uma licença de construção e o acto que recuse essa licença. No seu entender, não se justifica a pretensão de se imputar naturezas jurídicas distintas, na verdade, o enquadramento procedimental dos dois actos é o mesmo, uma vez que, correspondem aos dois modos legalmente previstos de colocar termo ao mesmo procedimento. Aplicam-se as mesmas normas, e o verifica-se o exercício da mesma competência normativa, dado que, tanto o acto que atribui como o que recusa a licença, configuram o cumprimento do mesmo dever de decisão, esgotando o exercício da competência.

Assim, e pelo exposto, não se verifica em qualquer dos dois actos que seja proferido, o incumprimento do dever de decidir, que se impõe à autoridade administrativa.

Quando existe acto de conteúdo negativo, o processo de condenação à prática do acto administrativo, não deixa de ter caracter impugnatório – apenas sucede que não se trata de uma impugnação cassatória , mas uma impugnação de plena jurisdição, em que a eventual eliminação da Ordem Jurídica do acto negativo será, sendo caso disso, o resultado de apreciação global de matéria controvertida a realizar pela instância judicial.

Quanto à eliminação na Ordem Jurídica do acto de indeferimento, o art. 66º/2 do CPTA estabelece que a eliminação daquele “resulta directamente da pronúncia condenatória” mediante a qual o tribunal imponha a prática do acto que tinha sido ilegalmente recusado.  

Se for deduzido pedido de estrita anulação de um acto administrativo de indeferimento, o tribunal convida o autor a substituir a petição por o pedido não ser o adequado, podendo haver lugar à substituição das contestações (como decorre do art. 51º/4 CPTA). No entanto, se o autor tiver pedido a anulação e a condenação da Administração à prática do acto devido, não há razão para exigir tal substituição, considerando-se importante que o pedido de condenação tenha sido deduzido. Aliás, como resulta do atrás citado art. 66º/2 o pedido de anulação da recusa é irrelevante, não comprometendo no entanto a viabilidade do pedido da condenação. A condenação à prática de acto devido, substitui assim, a pronúncia anulatória, pelo que, uma vez proferida a sentença de condenação não se pode sustentar que o indeferimento ainda subsiste na Ordem Jurídica por não ser devidamente anulado.




BIBLIOGRAFIA:

ALMEIDA, Mário Aroso de, "Considerações em torno do conceito de acto administrativo impugnavel", Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano - No Centenário do seu Nascimento - Volume II, Coimbra Editora, 2006

ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2012.

ALMEIDA, Mário Aroso de, O novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 4ª edição, Almedina, 2007.  
 
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Justiça Administrativa (Lições), 11ª edição, Almedina, 2011.

SILVA, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as acções no novo processo administrativo, 2ª edição, Almedina, 2009.



Ana Teresa Fanico

Aluna nº 19496

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