Conceito de Acto
Administrativo
Parte da doutrina tem reconduzido a nova noção de acto
administrativo introduzido pelo Art. 120º do CPA ao conceito amplo de Acto
Administrativo, do Prof. Marcelo Caetano. O conceito amplo de Acto
administrativo, abrange não só os actos de conteúdo decisório, mas também os
actos que exprimem apenas declarações de ciência, meros juízos de valor ou
opiniões.
O professor Aroso de Almeida entende, no entanto, que o
conceito plasmado no Art. 120º possui uma extensão intermédia (que não corresponde
ao conceito amplo de Marcelo Caetano nem ao conceito restrito germânico, que
nasceu de uma indefinição dogmática fruto das actuações jurídicas da
administração que se foi construindo, principalmente por referencia a sindicabilidade
ou, o mesmo será dizer, baseando-se na fiscalização de legalidade dos Actos de
Administração pelas acções contenciosas), fazendo para tal, ainda uma
referência À tipologia de Actos administrativos, desenvolvida pelo Prof.
Freitas do Amaral que, doravante incluir os meros actos administrativos, nos
seus exemplos desenvolvidos, referia-se tão somente a actos com conteúdo
decisório.
Conclui o Professor Aroso de Almeida, que os actos
administrativos a que o artigo supra citado remete, se circunscrevem apenas aos
actos com conteúdo decisório (não se incluindo todas as manifestações jurídicas
que, são meros juízos de valor ou opiniões que não exprimam resoluções que
determinem o rumo dos acontecimentos a adoptar.) Logo, a maioria dos actos
preparatórios dos procedimentos administrativos – pareceres não vinculativos,
informações e propostas – não são impugnáveis porque não se reconduzem a
decisões – não corporizam uma decisão de vontade.
Acto Administrativo
Impugnável
O conceito de Acto definitivo e executório, que Marcelo
Caetano definia como uma “conduta
voluntária de um órgão de Administração no exercício de um poder público que
para prossecução do interesse a seu cargo, dando termo a um processo gracioso
ou dando resolução final a uma petição, define situações jurídicas num caso
concreto”
coincide com o conceito, agora vigente, de “acto impugnável” do Art. 51º do
CPTA? Ou seja, o novo conceito, já serve por si só, para delimitar o universo
nas manifestações jurídicas concretas da Administração que podem ser objecto de
impugnação contenciosa ou necessitamos de identificar, dentro dos actos
administrativos, um círculo daqueles que, serão susceptíveis de impugnação?
O Art. 51º/1 do CPTA veio consagrar que, embora inseridos num
procedimento administrativo, são impugnáveis os actos administrativos com
eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo seja susceptível de lesar
direitos ou interesses legalmente protegidos . Assim, definiu o legislador, como princípio geral, o que se considera um acto contenciosamente impugnável,
sublinhando o preceito “eficácia externa”. Na definição dada pelo artigo supra
referido, parece mostrar-se pressuposto um conceito material de acto administrativo que se mostra enunciado no art. 120.º do CPA, no
entanto, tal não parece ser a posição adoptada por Vieira de Andrade, “… o conceito processual de acto administrativo
impugnável não coincide com o
conceito de acto administrativo, sendo, por um lado,
mais vasto e, por outro, mais restrito. É mais vasto apenas na dimensão
orgânica, na medida em que não depende da tradicional qualidade administrativa
do seu Autor (…) É mais restrito, na medida em que só abrange expressamente as
decisões administrativas com eficácia externa, ainda que inseridas num
procedimento administrativo, em
especial os actos cujo conteúdo
seja susceptível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos” -
artigo 51.º, números 1 e 2.
Consideram-se
actos com eficácia externa, os actos
destacáveis do procedimento, isto é, aqueles que, produzam efeitos jurídicos
externos autonomamente, sem ser através do acto principal do procedimento. Pretendem-se
assim excluir, os actos internos, ou seja, os que visem apenas a produção de
efeitos nas relações intra-pessoais, atingindo apenas aspectos orgânicos das
relações especiais de poder ou as relações entre órgãos administrativos, o que
se coaduna com o 268º nº4 da CRP.,
que estabelece um direito fundamental de impugnação dos actos administrativos lesivos
dos particulares.
O professor Vasco
Pereira da Silva sustenta que o critério da impugnabilidade depende da
função e da natureza da acção de impugnação:
Caso se trate de uma
acção para a tutela de um direito do particular face a Administração – estamos
perante uma função subjectiva, uma vez que a tutela principal que se pretende
assegurar é a do particular e só depois a da legalidade e interesse público;
Se, por outro lado, se tratar de uma acção para defesa da legalidade e do
interesse público, considera-se que a função é predominantemente objectiva e,
neste caso a recorribilidade dependerá da eficácia externa do acto
administrativo.
O referido professor,
critica ainda a redacção do artigo, sustentando que o mesmo nos leva a crer que o critério mais amplo é o da eficácia externa, enquanto o critério da
susceptibilidade de lesão de direito, seria uma especificação do primeiro,
quando na verdade, estes são dois critérios autónomos. Esta subalternização é,
alias contrariada, pelo regime do CPTA, que prevê no seu Art. 54º, a impugnação
de actos desprovidos de eficácia externa desde que, lesivos.
Quanto À oportunidade
para impugnar o acto, não importa, no entender do mesmo autor, se o acto foi
praticado no inicio, no meio ou no fim do procedimento, tendo-se colocado um
fim à definitividade horizontal (característica do acto
administrativo que constitui a resolução final do procedimento administrativo, que
põe termo ao procedimento).
O Professor Mário
Aroso de Almeida defende, com base no previsto nos artigos 51º numero 1 e 3
do CPTA que “não são apenas impugnáveis
os actos finais, que põem termo a procedimentos administrativos, mas também
podem ser impugnados actos que não sejam o acto final do procedimento.”
Afirmando que para tal baste “que se
trate de actos administrativos, isto é, que tenham, em si mesmos, um conteúdo
decisório.”
Relativamente à definitividade vertical, depreende-se
da ausência de determinação legal expressa, que os actos administrativos com
eficácia externa são imediatamente impugnáveis perante os tribunais
administrativos, não sendo requerida a prévia utilização de qualquer via de
impugnação administrativa. Como ainda parece decorrer dos arts 51º e dos
números 3 e 4 do art. 59º do CPTA. Conclui-se portanto que, para se verificar o
requisito do interesse processual não é necessário que o autor demonstre,
perante os tribunais administrativos que havia tentado “infrutiferamente obter a remoção do acto que considere ilegal por via
extrajudicial(…)A menos que esteja expressamente previsto na lei” Mário Aroso de
Almeida. Relativamente a esta alteração, Vasco
Pereira da Silva diz saudar a orientação do legislador no sentido de se ter
“afastado expressamente toda e qualquer
exigência de recurso hierárquico necessário” (Art. 51º/1 do CPTA) que
entendia ser inconstitucional à luz do Art. 268º/4 da CRP.
Actos de Conteúdo
Negativo
Apenas os actos de conteúdo positivo podem ser objecto de um
processo de impugnação , conteúdo esse que, nas palavras de Mario Aroso de
Almeida “não se esgote na mera recusa
de introduzir modificações jurídicas requeridas” (dirigidas À respectiva
anulação/declaração de nulidade).
Quanto aos actos de conteúdo negativo, a reacção contenciosa
passa pela dedução do pedido de condenação à prática de um acto que satisfaça a
pretensão do autor ou que dê uma nova definição ao caso, sem que se reincida
nas ilegalidades em que anteriormente, o acto negativo tenha incorrido (arts.
51º e 66º CPTA).
Contudo, Mario Aroso de Almeida, defende que os actos
administrativos de conteúdo negativo não deixam de ser considerados actos
administrativos, apelas pelo facto de terem deixado de poderem ser objecto de
processo de impugnação, colocando como exemplo um acto que atribua uma licença
de construção e o acto que recuse essa licença. No seu entender, não se
justifica a pretensão de se imputar naturezas jurídicas distintas, na verdade,
o enquadramento procedimental dos dois actos é o mesmo, uma vez que,
correspondem aos dois modos legalmente previstos de colocar termo ao mesmo
procedimento. Aplicam-se as mesmas normas, e o verifica-se o exercício da mesma
competência normativa, dado que, tanto o acto que atribui como o que recusa a
licença, configuram o cumprimento do mesmo dever de decisão, esgotando o
exercício da competência.
Assim, e pelo exposto, não se verifica em qualquer dos dois
actos que seja proferido, o incumprimento do dever de decidir, que se impõe à
autoridade administrativa.
Quando existe acto de conteúdo negativo, o processo de
condenação à prática do acto administrativo, não deixa de ter caracter
impugnatório – apenas sucede que não se trata de uma impugnação cassatória ,
mas uma impugnação de plena jurisdição, em que a eventual eliminação da Ordem
Jurídica do acto negativo será, sendo caso disso, o resultado de apreciação
global de matéria controvertida a realizar pela instância judicial.
Quanto à eliminação na Ordem Jurídica do acto de
indeferimento, o art. 66º/2 do CPTA estabelece que a eliminação daquele
“resulta directamente da pronúncia condenatória” mediante a qual o tribunal
imponha a prática do acto que tinha sido ilegalmente recusado.
Se for deduzido pedido de estrita anulação de
um acto administrativo de indeferimento, o tribunal convida o autor a
substituir a petição por o pedido não ser o adequado, podendo haver lugar à
substituição das contestações (como decorre do art. 51º/4 CPTA). No entanto, se
o autor tiver pedido a anulação e a condenação da Administração à prática do
acto devido, não há razão para exigir tal substituição, considerando-se
importante que o pedido de condenação tenha sido deduzido. Aliás, como resulta
do atrás citado art. 66º/2 o pedido de anulação da recusa é irrelevante, não
comprometendo no entanto a viabilidade do pedido da condenação. A condenação à prática de acto devido,
substitui assim, a pronúncia anulatória, pelo que, uma vez proferida a sentença
de condenação não se pode sustentar que o indeferimento ainda subsiste na Ordem
Jurídica por não ser devidamente anulado.
BIBLIOGRAFIA:
ALMEIDA, Mário Aroso de, "Considerações em torno do conceito de acto administrativo impugnavel", Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcello Caetano - No Centenário do seu Nascimento - Volume II, Coimbra Editora, 2006
ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2012.
ALMEIDA, Mário Aroso de, O novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos, 4ª edição, Almedina, 2007.
SILVA, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise – Ensaio sobre as
acções no novo processo administrativo, 2ª edição, Almedina, 2009.
Ana Teresa Fanico
Aluna nº 19496
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